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O atoleiro da construção civil

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Por Danilo Vivan

Responsável por cerca de 6% do PIB brasileiro, a indústria da Construção Civil deverá, em 2015, registrar uma queda de 7% na comparação com o ano anterior. Os dados são do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusConSP). Pior: fortemente dependente da chamada Formação Bruta de Capital Fixo – investimentos em bens de capital para aumentar a produção no futuro – o setor pode amargar um longo período de maus resultados. Um pé no freio agora na compra de máquinas e equipamentos pode dificultar a retomada mais adiante.

“As perspectivas não são boas. Os investimentos na construção são de longo prazo e, em 2015, os investidores e famílias ficaram fortemente retraídos. Poucos contratos novos foram assinados”, afirma o presidente do SindusConSP,  José Romeu Ferraz Neto.

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presidente do SindusConSP, José Romeu Ferraz Neto

O economista Itaiguara Bezerra, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE-FGV), coloca a questão em números. Segundo ele, a Formação Bruta de Capital Fixo na economia brasileira deverá cair 13,6% em 2015 e 11,3% em 2016. “Está havendo um desinvestimento, o que, num primeiro momento significa desemprego e queda do capital de giro. Numa segunda etapa, quando houver uma retomada da procura por imóveis, por exemplo, a perspectiva é de pressão inflacionária, já que a oferta vai demorar para se adequar à demanda”, afirma o economista. Ele enxerga na crise política a principal dificuldade na retomada dos investimentos.

Com a produção em queda, o setor – tradicionalmente grande empregador de mão de obra menos qualificada – começa a dispensar trabalhadores. Estimativas do SindusConSP dão conta de que até o final do ano cerca de 500 mil vagas serão fechadas. Na mesma direção, a comercialização de máquinas e equipamentos pesados – outro indicativo da Formação Bruta de Capital Fixo – encontra-se num verdadeiro atoleiro. Segundo a ANFAVEA, as vendas de tratores de esteira, por exemplo, registram, no período de janeiro a julho de 2015, uma queda de 46% na comparação com igual período de 2014. E as vendas de retroescavadeiras caíram 38,2%.

Uma análise mais aprofundada mostra que nenhum dos subsegmentos da construção civil (edificações, habitação popular e infraestrutura) está, hoje, em condições de liderar uma retomada dos investimentos, puxando o emprego, as vendas de máquinas e o PIB do setor, de maneira geral.

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Na área de edificações, após uma década de crescimento, o momento é de queda nos lançamentos, como resultado de um estoque em níveis elevados. Impulsionado por avanços na legislação e por uma estabilidade na economia que motivou muita gente a trocar de casa, o total de imóveis financiados aumentou 900% de 2004 a 2014. Agora, o cenário é outro: com os juros e a inflação em alta e a principal fonte de funding, a Caderneta de Poupança se esgotando, os bancos encontram-se na defensiva. Resultado: juros mais altos no financiamento e menor parcela financiada, o que, por sua vez, tem feito aumentar os estoques e diminuir o número de lançamentos, com impactos no futuro sobre toda a cadeia. Na Região Metropolitana de São Paulo, por exemplo, dados do SecoviSP (Sindicato da Habitação) mostram que, de janeiro a julho, o total de lançamentos foi de 18,3 mil unidades, queda de 12,4% na comparação com o mesmo período de 2014. “Toda a indústria imobiliária (bancos, incorporadoras e imobiliárias) experimenta uma ressaca sem precedentes. Diferente das décadas passadas, o mercado vivenciou ganhos exponenciais nos últimos anos em todos os setores, do crédito a mão de obra, e o tombo agora será maior”, avalia Marcelo Prata, fundador dos sites Canal do Crédito e Resale.com.br. O Sonho do Primeiro Imóvel apresentou, na série Casa Própria: Passado, Presente e Futuro, a evolução do mercado imobiliário (edificações) na última década.

Pizza-ConstrucaoNas habitações populares, que têm, no Minha Casa Minha Vida, do Governo Federal, seu principal expoente, a situação não é melhor. O programa, que nos últimos seis anos destinou R$ 265,6 bilhões à construção de moradias, ainda não teve sua terceira etapa lançada. E o governo já adiantou que, num contexto de ajuste fiscal, o programa será afetado. “O governo está segurando a fase três basicamente porque ainda não dispõe dos recursos necessários ao subsídio da faixa 1 do programa – juros atualmente subsidiados pelo Tesouro e renda familiar até R$ 1,8 mil mensais. Mas já poderia ter lançado as diretrizes para as faixas dois e três, a fim de as construtoras poderem se planejar e começarem a submeter os respectivos projetos aos agentes financeiros”, afirma Ferraz Neto, do SindusConSP. A Sondagem da Construção, do IBRE-FGV, mostra que, em junho, 65,2% das empresas participantes do Minha Casa, Minha Vida, apresentavam atraso no fluxo de pagamentos. Sem uma sinalização clara, quem depende desse programa está em compasso de espera.

O impulso para a retomada da Construção Civil poderia, então, vir do terceiro subsegmento, a infraestrutura. Num país que possui históricos e reconhecidos problemas de logística, como o Brasil, seria de se esperar que o governo capitaneasse a busca por melhorias na área de Transporte (além de Energia e Telecomunicações), o que, por sua vez, poderia atrair o interesse de construtoras e fundos de pensão, cuja estratégia é o retorno de longo prazo e baixo risco, compatível com esse tipo de empreendimento.

Nesse sentido, o Ministério do Planejamento lançou, em maio, o Programa de Investimento em Logística (PIL), que injetaria cerca de R$ 200 bilhões no setor, sendo R$ 66 bilhões em rodovias, R$ 86 bilhões em ferrovias, R$ 37 bilhões em portos e R$ 8 bilhões em aeroportos. Tudo em formato de Parcerias Público-Privadas (PPPs), o que, em tese, significa menos dinheiro do governo nestes tempos de ajuste fiscal.

O setor vê com bons olhos a iniciativa. “Diante da escassez de verbas do governo para a ampliação da infraestrutura, o programa tem o mérito de atrair os recursos da iniciativa privada. Portanto, quanto mais atrativo for, mais colaborará para o desenvolvimento do país e para a retomada da indústria da construção. As regras ainda não estão totalmente fechadas, mas o governo vem sinalizando positivamente com o aumento das taxas de retorno e a dispensa de patrimônio líquido mínimo para participação nas licitações”, avalia Ferraz Neto, do SindusConSP. As experiências recentes nesse sentido foram positivas. Somadas, as concessões dos aeródromos de Brasília (DF), Confins (MG), Galeão (RJ), Viracopos (SP), Guarulhos (SP) e São Gonçalo do Amarante (RN), geraram um total de R$ 26 bilhões, sempre com a participação de grupos estrangeiros.

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Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B consultoria

Para o economista Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B consultoria, os ativos oferecidos no PIL são, de fato, atrativos. A questão, segundo ele, é que as condições mudaram completamente em relação ao período anterior de concessões. “As grandes empresas de infraestrutura brasileiras, que sempre investiram nesse tipo de projeto, enfrentam problemas. Em primeiro lugar, muitas delas tiveram os ratings de seus títulos rebaixados pela Standard & Poor’s na sequencia à perda do grau de investimento pelo Brasil, o que significa maior dificuldade para se financiar. Em segundo, a operação Lava Jato fez com que os bancos ficassem mais conservadores na concessão de recursos para essas empresas. Por fim, o BNDES não possui mais tantos recursos para emprestar como há alguns anos”, afirma. Quanto às debêntures de Infraestrutura, lançadas com incentivos fiscais para ajudar no financiamento de infraestrutura, Frischtak entende que, com os juros dos títulos do Tesouro nas alturas, o apetite dos investidores estrangeiros por títulos privados é mínimo. “Há dificuldades em deslanchar o programa; com sorte, teremos alguns leilões no ano que vem.”

Por fim, o professor Itaiguara, da FGV, acrescenta outro vetor de investimentos em infraestrutura que vem sendo seriamente afetado: a Petrobrás, outrora maior companhia do País e hoje com bem menos poder de fogo. A empresa já anunciou que deverá cortar R$ 90 bilhões em investimentos para o quinquênio 2015-2019 em relação a previsões anteriores. “A companhia era um grande ofertante de obras, mas agora precisa arrumar a casa”.

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É provável que, em algum momento, a recuperação do setor venha. Afinal, o País possui uma enorme carência de investimentos em infraestrutura e em moradia e um dos maiores mercados consumidores do mundo, o que, de alguma forma, contribui para atrair esses investimentos. Para o atual e os próximos governos, o desafio está em desamarrar o nó político e reconquistar a confiança dos agentes de mercado.

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