Nova lei trará mais segurança aos compradores de imóveis

  • Compartilhe!
Teotonio Rezende, diretor de habitação da CAIXA

Teotonio Rezende, diretor de habitação da CAIXA

Executivo da CAIXA fala sobre a lei que trará mais segurança aos compradores de imóveis, de novas fontes de recursos necessárias para o mercado imobiliário e do cenário atual do setor

Por Fabio Elizeu

O executivo Teotônio Rezende é testemunha da evolução do crédito imobiliário no País nas últimas décadas. Em mais de 35 anos no setor, viu diminuir a papelada exigida nos processos de obtenção dos imóveis, assim como o tempo desses processos – tendo, inclusive participado, da elaboração de leis que resultaram nessas reduções de burocracia. Diretor de habitação da CAIXA (banco que responde por 70% do crédito imobiliário no País) e vice-presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Rezende, fala, nesta entrevista exclusiva, sobre mais um avanço: a concentração dos ônus na matrícula do imóvel (Lei 13.097/15, aprovada recentemente e que trará mais segurança aos compradores de imóveis). Fala, também de novas fontes de recursos para o mercado imobiliário e do cenário atual do setor.

Sonho do Primeiro Imóvel – Qual a importância da concentração dos ônus na matrícula do imóvel para o mercado imobiliário e como essa nova lei pode beneficiar o consumidor final, o comprador de imóveis e também os vendedores?

Teotonio Rezende – A concentração dos ônus na matrícula foi uma luta de todo o segmento, unindo basicamente o setor financeiro – capitaneado pela Abecip, o setor da construção civil, os cartórios e o próprio Governo Federal. Este é um projeto que todos entendiam ser importante.  Muito embora houvesse divergência em alguns aspectos, o setor sabia que era algo altamente valioso para a sociedade como um todo. Com a concentração dos ônus na matrícula do imóvel você traz uma segurança muito grande para os compradores de imóveis, pois caso não haja nenhum registro negativo na matrícula, o consumidor terá certeza de que não haverá surpresas desagradáveis no futuro com aquele imóvel. Além disso, traz uma segurança muito grande para a instituição financeira, pois é possível reduzir o volume exigido de documentações.

Vale lembrar que o risco jurídico tem um peso importante no spread bancário (diferença entre o que os bancos pagam na captação de recursos e o que eles cobram ao conceder um empréstimo), então na medida em que você toma qualquer iniciativa que reduz esse risco, no médio e longo prazo ela se reverte em redução do custo do capital para o tomador. E para as construtoras, a lei também é vantajosa, ou seja, é uma ação em que todas as partes saíram ganhando. Foi um avanço importantíssimo e assim que terminar o prazo de carência que foi dado para ela entrar plenamente em vigor, com certeza a concessão do crédito imobiliário se tornará bastante mais simples, pois certidões deixarão de ser exigidas, reduzindo o custo, o risco jurídico e o operacional, tanto para a instituição financeira quanto para os compradores. Tudo isso resultará em maior segurança e menos custo para a sociedade como um todo.

SPI – A lei entrará em vigor no final de final de 2016. Até essa data os consumidores têm que tomar os mesmos cuidados na hora de comprar um imóvel? E os vendedores, devem tirar todas as certidões e verificar se há algum problema com o imóvel? Essas medidas continuam valendo?

Rezende – Como temos um estoque de possíveis ações em que a qualquer momento nesse intervalo de carência o credor pode requerer a penhora do bem, enquanto não terminar essa carência ainda é necessário ter todos esses cuidados. Isso não significa que a lei não está em vigor e que não está beneficiando a sociedade, porque tudo aquilo que acontecer a partir de sua publicação terá peso contra terceiros se tiver averbado. Deste modo, o risco fica só sobre o estoque de ações existentes anteriormente. Isso parece que teria tirado um pouco da importância da lei, mas não é o caso. De fato, uma mudança de tamanha magnitude não permite que apenas se vire a chave do dia para a noite, por isso essa negociação durou alguns anos e chegou nesse acordo. Nesse intervalo, ainda é necessário ter esses cuidados, mas os ganhos já podem ser sentidos.

SPI – Em termos de prazo, é possível ter uma ideia do tempo que o consumidor ganha nesse processo de financiamento com a nova lei?

Rezende – Eu diria que para o consumidor o maior ganho é em segurança. Conheço casos concretos de pessoas que compraram um imóvel, estava tudo certo com a documentação e três, quatro anos depois uma sentença anulou todas as vendas realizadas. Em alguns casos, surgiram dívidas e consumidores que compraram uma unidade do quarto proprietário perderam o imóvel. Ou seja, só a eliminação dessa possibilidade já compensa esse avanço. Eu também diria que, reduzindo a preocupação da busca por certidões, num futuro não muito distante, será possível fechar um contrato em 48 horas.

SPI – E com relação ao custo, o senhor tem uma ideia de quanto é a redução para o consumidor?

Rezende – No caso do custo, é difícil precificar. Para a instituição financeira a grande vantagem fica relacionada ao custo interno, com mão de obra, pois será possível minimizar as análises feitas por advogados. Mas o maior ganho é a redução do risco jurídico e operacional, que será refletido em algum momento para o tomador final.

SPI – Comparando dez anos atrás com hoje em dia, o senhor tem notado uma agilidade maior no processo de financiamento imobiliário graças ao número de documentação que vem sendo reduzida ao longo dos anos?

Rezende–  Vou me permitir voltar um pouco mais nos meus 36 anos de crédito imobiliário. Sem exagero, um processo de financiamento de aquisição de imóveis simples não tinha menos do que 200 folhas, sendo 70% deste volume composto por certidões. Hoje, nos preocupamos quando pegamos um dossiê, pois há a impressão de que está faltando alguma coisa, já que são apenas meia dúzia de páginas. Essa redução de documentação e simplificação de processo do crédito imobiliário podemos comparar com a evolução da tecnologia, é uma revolução em termos de simplificação e agilidade que se verificou ao longo dos dez últimos anos que realmente fez com que o crédito imobiliário se tornasse uma operação extremamente simples. Atualmente, do comprador basicamente se solicita CPF, identidade e comprovante de renda.

SPI – Quais outros ganhos a nova lei trouxe?

Rezende –  A criação da Letra imobiliária Garantida (LIG), que é o nosso covered bond brasileiro. O Brasil é um dos poucos países do mundo que ainda é totalmente dependente de crédito direcionado – Fundo de Garantia e poupança – para financiar o crédito imobiliário. A LIG surge como uma oportunidade no médio prazo para trazer importante solução de mercado, não para substituí-los Poupança e FGTS), mas sim para complementá-los e assim garantir que esse ciclo virtuoso do crédito imobiliário brasileiro continue sustentável.

SPI – O custo de captação da poupança para os bancos é menor e a LIG provavelmente terá um custo de mercado um pouco maior, isso afetará o custo para o consumidor final?

Rezende –  Por isso que eu digo que é no médio e longo prazo, ou seja, acho que é importante e urgente nós regulamentarmos todo o nosso arcabouço legal e normativo da LIG para você começar a fazer teste de mercado. Mas é claro que com taxa de juros de dois dígitos é difícil você fazer qualquer negócio a um preço razoável. Eu diria que é relevante nós normatizarmos a LIG agora, mas eu não creio que em 2015, meados de 2016, ela tenha volumes expressivos de negócios. No nosso caso, por exemplo, nossa urgência é para começar a fazer teste de mercado e ajustar os modelos operacionais. Não acreditamos na LIG no curto prazo como um instrumento que irá alavancar recursos para complementar a poupança. Mas no médio prazo com certeza ela virá a ser um instrumento tão importante quanto é na Europa atualmente.

SPI – Os pilares do crédito imobiliário sempre foram o emprego, renda do trabalhador, a taxa de juros e o cenário econômico. O senhor vê esses pilares afetados atualmente?

Rezende –  A grande revolução do crédito imobiliário no Brasil foi verificada a partir de 2002, 2003 e, principalmente, a partir de 2005. Nada disso teria acontecido se não tivéssemos estabilidade econômica. Sem ela, poderíamos ter feito as normas mais modernas do mundo que não teríamos o crédito imobiliário crescendo. Além disso, juntamente com a estabilidade, verificamos crescimento da renda, do emprego e uma expectativa positiva tanto do setor produtivo quanto dos consumidores. Agora, vivemos um período de restabelecimento da economia. Mas o melhor indicador disso, em termos de instituição financeira, é a inadimplência. Nós continuamos, há um bom tempo, com os menores índices de inadimplência da história do Sistema Financeiro da Habitação. Se pegarmos o histórico do crédito imobiliário e voltarmos no ano de 1964 e comparar com hoje, os índices estão entre os melhores. Muito embora nós tenhamos multiplicado por quase 30 o volume de contratação entre 2002 e 2014, a nossa inadimplência tem níveis que dão inveja a qualquer país de primeiro mundo.

SPI – Olhando os números de contratação de financiamento imobiliário de março, é possível notar que a pessoa física ainda compra imóveis solicitando o financiamento imobiliário, diferentemente das construtoras, do crédito à pessoa jurídica, que apresentou desaquecimento? O senhor acredita nessa tendência da pessoa física como um forte motor do setor?

Rezende –  No caso da pessoa jurídica nós estamos vendo hoje um ajuste para uma questão mais racional. Até 2011, meados de 2012, nós vivemos uma euforia total e a partir daí o setor da construção civil começou uma arrumação para voltar a uma realidade sustentável a longo prazo. É mais do que natural que houvesse uma redução nesse volume e isso deve se repetir esse ano. Nesse momento, o setor está mais voltado para comercializar os estoques de  2014 e os que estão sendo produzidos em 2015, fruto daquele grande volume de contratação ocorrido até 2011. Por isso é natural que haja uma adequação dos lançamentos.

Com relação à pessoa física, nós da Caixa, que representamos quase 70% do mercado, avaliamos que não está acontecendo nada de diferente. Se você acompanhar nosso simulador, que é um importante termômetro de demanda, ele continua tendo entre 5 e 6 milhões de simulações por mês. Já o volume de pedidos de financiamento, cerca de 3 mil por dia, também não mudou. Mas se nós quiséssemos imprimir um ritmo mais amplo, não faltaria demanda para fazermos até 5 mil contratos por dia. O fator demanda pessoa física na Caixa, tanto no interesse em efetuar um financiamento quanto na busca efetiva, continua inalterado. Agora, não vamos ser utopistas achando que este cenário continuará inalterado. Acreditamos que ao longo dos próximos meses é possível que haja algum arrefecimento dessa demanda, não digo de forma tão abrupta, porque na habitação social acreditamos que a demanda continuará aquecida. Isso porque, se olharmos o resultado das empresas que trabalham mais fortemente na habitação social, a velocidade de vendas delas é bem diferente de quem atua na habitação de mercado. O mercado de habitação social deve continuar bem aquecido e o de habitação de mercado talvez tenha uma pequena redução.

*A entrevista foi realizada antes do anúncio de mudanças nas regras de financiamento na CAIXA.

MAIS SOBRE O ASSUNTO...

Ops! Nenhuma postagem relacionada.

Acompanhe-nos nas Redes Sociais